terça-feira, 16 de junho de 2009

Realidade fabricada






Em 1999 quando estreou a febre mundial de reality shows, todos ficamos fascinados com a novidade que revolucionou a televisão mundial. De repente, ver outras pessoas fazendo as mesmas coisas que nós fazemos em nossas casas se tornou uma forma popular de entretenimento, e o programa preferido do jantar em família passou a ser assistir desconhecidos jantando trancafiados em uma casa melhor que a nossa. Mas o que falhamos em perceber foi como essa onda de realidades fabricadas televisionadas se tornaria grosseira, opressiva e manipuladora.

Duas das maiores redes de TV do país lançaram recentemente dois novos programas do estilo "assista durante 12 semanas ininterruptas ou você não entenderá a trama e será excluído das rodinhas de conversas de amigos e colegas de trabalho". Nenhuma novidade nisso, pois quando um programa acaba outro já é logo emendado para que você telespectador continue acorrentado à sua TV. Lembro durante o carnaval desse ano quando estava na casa de um amigo jantando, conversando e curtindo o feriado, que as cerca de 15 pessoas lá presentes viraram perfeitos zumbis grudados na telinha da televisão quando o BBB (big brother brasil) foi ao ar. O clima de diversão, conversas, comilanças sumiu e deu lugar a discussões sobre quem era a vilã do programa e quem merecia vencer. Como não acompanhava essa novela do século XXI pude perceber como eram patéticas aquelas pessoas que deixavam de lado suas próprias vidas e interações reais para discutir e decorar os acontecimentos forjados pela TV. Não quero dizer com isso que eu seja imune à essa manipulação da mídia, apenas que aquele momento em que eu não era um membro do gado arrebanhado pelo BBB me serviu para perceber o quão absurda se tornou a situação.


Embora no Brasil as TVs abertas ainda dominem o mercado, o problema dos reality's é imensamente maior na tv a cabo. Nela você pode encontrar as tendências que logo serão adotadas por todos os canais, com temas tão variados quanto esdrúxulos. Solteiros desesperados atrás de amor, noivas neuróticas e casais prontos para o divórcio. Cabelereiros pretensiosos, estilistas deslumbrados e riquinhas mimadas e inúteis. Cantores desafinados, dançarinos descoordenados e talentosos sem talento. Gordos que querem ser magros, magros anoréxicos à beira da morte e pessoas sem auto-estima que pagam qualquer preço para mudar sua aparência. Caminhoneiros do gelo, construtores de túneis e domadoras de adolescentes. Será que existe um limite para a estupidez dos assuntos que podem ser transformados em programas de TV?

É engraçado lembrar como achamos ridídulo que a população da Roma antiga possa ter sido manipulada com a política do "pão e circo", quando a única diferença para os dias atuais é que o circo invadiu nossas casas, tomou nosso tempo livre, e nos deixou sem tempo para vivermos nossas vidas. Mas isso não parece ser problema, desde que vigiemos a de outras pessoas através da realidade fabricada pela mídia. Quem precisa criar os próprios filhos quando se pode assistir a uma babá adestrando os monstrinhos alheios? Para que se aperfeiçoar e subir na carreira quando é mais divertido rir enquanto vemos alguém ser demitido de mentirinha? Qual a vantagem de se estressar com os desvios de dinheiro do governo quando é mais prazeroso nos ocuparmos com a última fofoca direto do edredon da casa mais vigiada do país?

Será que perceberemos quando chegarmos ao fundo do poço? Será que já chegamos? Talvez o fundo do poço seja quando os reality's refletirem a nossa verdadeira realidade. Serão programas sobre pessoas sem vontade própria nem ânimo, cuja existência se resume à escravidão do trabalho e da TV, que vivem em função das realidades fabricadas pela tela brilhante que domina suas salas, suas mentes e suas vidas. Afinal de contas, é mais fácil ser manipulado na segurança de nosso lar do que sair para o mundo e gozar das alegrias e sofrer os dessabores que ele tem a nos oferecer. Mas chega de escrever esse texto tão negativo. Pensar sobre o assunto já cansou minha cabeça acostumada a ser entretida. E, como American Idol já acabou este ano, vou para frente da TV descobrir quem será o Survivor da China.

6 comentários:

  1. Ótima analise, explanou com muita precisão e habilidade invejavel...

    Joseanne - a nova atualização do meu blog, acessem...
    http://cemiteriodaspalavrasperdidas.blogspot.com/

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  2. muita gente quer entrar voluntariamente no circo televisivo para ganhar seu pão.
    mais interessante é como as pessoas querem que vc tbm participe disso tudo, como se fosse um grande absurdo não estar ligado na telinha, não cohecer as personagens, etc.
    me impressiona o poder que tv ainda tem de fazer as pessoas engulhirem certas coisas sem questionar.

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  3. ok! parceria fechada! posta o meu lá
    www.todoeureka.blogspot.com

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  4. Olá,
    Concordo com voce em pontos e virgulas, sinto-me estranha quando em companhia de amigos todos falam dos personagens da novela como se fizessem parte de nosso ciclo de amizades, quando digo que não sei de quem se trata, (pois não acompanho novelas, detesto-as), sou olhada como se fosse um ET, acontece a mesma coisa com a minha ignorância com relação a qualquer individuo desses programas citados por voce.
    Sinto-me fora, mas assim prefiro, melhor do que
    ser manipulada, virar um robô, ou alguém sem conteúdo.
    Que bom que encontrei seu blog, alguém inteligente no planeta Terra.
    Abraços,
    Léah

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  5. Muito bom o texto. Apesar de eu deixar ser manipulado por essa onda...

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  6. Incrível, adorei o texto! Tbm sou manipulada por esses programas, infelizmente! Mas acho inevitável! Mas quando paro pra pensar e analisar quando tamos conversando sobre aqueles personagens da novela q nem o conhecemos mais é como se conhecesse rsrsrs, me sinto ridícula, é como se a gente convivesse com eles diariamente em nossa casa, mas entre aspas é o que realmente acontece por ter virado escrava da telinha! Quando me pego conversando com a galera sobre aquela turma da novela, paro e penso oq estou fazendo? eu nem conheço eles? kkkkkkk ... incrível como a televisão nos enfeitiça e consegue atingir nossa emoção!
    Vlw
    Bjão

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